STF valida “revisão da vida toda” nas aposentadorias

02/12/22

Poder360
Por Lucas Mendes
blogfolhadosertao.com.br

STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu nesta 5ª feira (1º.dez.2022), por maioria, validar a possibilidade da chamada “revisão da vida toda”, tese que poderá ser usada para o recálculo de aposentadorias.

A Corte decidiu que contribuições previdenciárias anteriores ao Plano Real, instituído em 1994, podem ser usadas para recalcular valores de aposentadorias. Com isso, o benefício de alguns brasileiros aumentará.

O placar foi 6 a 5. A corrente vencedora foi a do relator, ministro Marco Aurélio (aposentado). Acompanharam o entendimento os ministros Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber.

Votaram contra a possibilidade de revisão da vida toda os ministros Nunes Marques, Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli e Gilmar Mendes.

Ainda não há um cálculo de quanto a mudança pode custar. O INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) fez uma estimativa de que a União teria prejuízo de R$ 46 bilhões se metade dos aposentados nos últimos 10 anos solicitasse a revisão.

A revisão das aposentadorias deverá ser feita caso a caso, em processos na Justiça.

A maioria dos ministros entendeu ser possível aplicar a regra mais vantajosa para a definição das aposentadorias de trabalhadores que ingressaram no RGPS (Regime Geral de Previdência Social) antes da Lei 9.876/1999. A norma alterou a forma de contagem dos salários de contribuição para o cálculo do benefício.

A lei estabeleceu uma regra de transição para os trabalhadores, que excluiu contribuições anteriores a julho de 1994. A intenção era garantir uma situação benéfica a quem se aposentasse, evitando efeitos da inflação sobre os salários recebidos antes do Plano Real.

A norma de transição, no entanto, acabou sendo menos atrativa a parte dos trabalhadores. Em alguns casos, os valores das aposentadorias seriam maiores se calculados pela regra definitiva.

A decisão tem repercussão geral, ou seja, deve ser aplicada por todos os tribunais do país em casos semelhantes. A tese fixada foi a seguinte:

“O segurado que implementou as condições para o beneficio previdenciário após a vigência da lei 9876 de 26/11/1999 e antes da vigências das novas regras constitucionais introduzidas pela emenda constitucional 103 de 2019 têm o direito de optar pela regra definitiva, caso esta lhe seja mais favorável”. 

“Revisão da vida toda”

A discussão sobre a chamada “revisão da vida toda” vem de questionamentos de aposentados sobre a Lei 9.876 de 1999. O texto trouxe uma nova fórmula de cálculo da aposentadoria, determinando uma transição para quem já contribuía com a Previdência antes do Plano Real. O marco da transição seria julho de 1994.

No caso específico discutido pelo STF, um aposentado questionava o cálculo de sua aposentadoria, fixada pela regra de transição em R$ 1.493. A defesa do aposentado dizia que, caso fossem consideradas as contribuições feitas antes de julho de 1994, o valor da aposentadoria seria de R$ 1.823.

A tese determina que o cálculo da aposentadoria poderá considerar todas as contribuições feitas pelo trabalhador, inclusive aquelas anteriores ao Plano Real, caso essa opção seja mais benéfica ao aposentado.

Quem se beneficia?

Apesar da nova tese, a mudança deve beneficiar um número pequeno de aposentados, segundo o advogado João Osvaldo Badari, que atuou como amicus curiae no processo junto ao IEPREV (Instituto de Estudos Previdenciários).

A regra não alcança o aposentado que recebeu seu 1º pagamento de benefício há mais de 10 anos, em razão da decadência decenal. Ou seja, quem já recebe aposentadoria há ao menos uma década por meio da base de cálculo da regra de transição não poderá pedir uma revisão.

O aposentado beneficiado pelas regras instituídas pela Reforma da Previdência de 2019 também não pode solicitar a revisão, uma vez que recebe os valores a partir de regras novas.

Segundo Badari, a revisão é voltada para quem contribuía com a previdência antes do Plano Real e passou pela regra de transição, cujo marco foi em julho de 1994. Os mais afetados seriam trabalhadores que recebiam salários maiores e que viram sua remuneração diminuir até o marco da implantação do Plano Real.

Quem começou a contribuir com a previdência após julho de 1994 não é afetado.

“Uma regra de transição jamais pode ser mais desfavorável que a regra permanente. Isso vai de acordo com decisões do próprio STF na aplicação do melhor benefício”, afirmou o advogado.

Não há um cálculo exato do quanto a mudança fixada pelo STF poderá custar aos cofres públicos. Em voto contra a revisão da vida toda, o ministro Nunes Marques citou gastos de R$ 46,4 bilhões até 2029, segundo dados informados pelo INSS.

O número, porém, é questionado por Badari. “O INSS coloca que os anos que mais teriam gastos seriam 2009, 2010 e 2011, mas há o prazo decadencial. A partir dos 10 anos em que o aposentado recebe o benefício, ele não pode pedir a revisão”, disse.

O advogado ressalta que a revisão deverá ser feita caso a caso mediante um cálculo prévio e alerta aposentados a tomarem cuidado com promessas de decisões a partir da decisão do Supremo. “A revisão não é generalizada, e sim de caso a caso”, declarou.

Julgamento

A análise do caso no plenário do STF começou na 4ª feira (30.nov) com as manifestações de partes e de entidades que acompanham o processo. O procurador-geral da República, Augusto Aras, se manifestou favoravelmente à revisão da vida toda.

O único a votar na 4ª foi o ministro Nunes Marques, contrário à revisão. O magistrado destacou em seu voto o impacto financeiro de uma decisão favorável aos aposentados. Para o ministro, a regra de transição que estabelece o início do período de cálculo dos benefícios previdenciários em julho de 1994 é compatível com a Constituição.

Nesta 5ª feira (1º.dez) votaram os demais ministros.

O caso começou a ser julgado no plenário virtual do STF ainda em 2021. Um pedido de vista (mais tempo para análise) do ministro Alexandre de Moraes havia paralisado o julgamento.

O tema voltou a ser analisado pela Corte em março deste ano, também no plenário virtual. Todos os ministros já haviam votado e havia sido formada uma maioria de 6 a 5 a favor da revisão da vida toda (entendimento favorável aos aposentados).

Na ocasião, Nunes Marques fez um pedido de destaque, o que faz o julgamento voltar à estaca zero e remete o caso para o plenário físico do Supremo. No plenário virtual, os ministros depositam seus votos no sistema eletrônico da Corte e não há debate.

Destaque

O pedido de destaque de Nunes Marques foi feito às vésperas da conclusão do julgamento no plenário virtual, em 8 de março.

Incomum, a manobra poderia alterar o resultado do julgamento e beneficiar a posição de Nunes Marques: o voto do ministro Marco Aurélio Mello, proferido antes de se aposentar em 2021, seria descartado porque o caso seria reiniciado no plenário físico.

Nessa situação, caberia ao ministro André Mendonça, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro, votar no lugar de Marco Aurélio. O ministro aposentado era favorável à “revisão da vida toda”.

Ocorre que, em 9 de junho, o Supremo decidiu fixar um novo entendimento sobre a validade de votos já proferidos por ministros que se aposentaram da Corte. A partir da data, ficam mantidos os votos dos magistrados aposentados feitos no plenário virtual, em caso de pedido de destaque.

Assim, só o voto de Marco Aurélio ficou preservado e André Mendonça não votou

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