Especial de domingo: Bolsonaro modo desespero

03/07/22

blogfolhadosertao.com.br

 

 

Por Ricardo Leitão *

 

O Senado aprovou (30/6), em dois turnos, proposta de emenda constitucional (PEC) que institui até o fim do ano Estado de Emergência no Brasil. Coincidentemente, tempo em que se conclui o desgoverno de Jair Bolsonaro. O texto seguiu para análise da Câmara dos Deputados, que deve analisá-lo e aprová-lo até o próximo dia 8.

 

 

Chamada no Congresso de PEC das Bondades, a emenda constitucional anuncia o modo desespero de Sua Excelência. A três meses das urnas de 2 de outubro, ele dispara os últimos cartuchos para recuperar sua popularidade e evitar a vitória do petista Luiz Inácio Lula da Silva no primeiro turno.

A munição é forte: aumento de R$ 400,00 para R$ 600,00 no Auxílio Brasil e cadastramento de mais de 1,6 milhão de novas famílias ao programa; pagamento de uma bolsa mensal de R$ 1 mil a 900 mil caminhoneiros autônomos e taxistas (número ainda indefinido); aumento no valor para compra de um botijão de gás a cada dois meses para famílias pobres; compensação aos estados, para viabilizar a gratuidade do transporte público aos idosos; suplementação financeira ao programa Alimenta Brasil e repasse de recursos aos estados para que limitem a 12% a taxação do ICMS sobre combustíveis.

As “bondades” custarão ao Tesouro R$ 41,2 bilhões, em créditos extraordinários, liberados a partir de agosto. Trata-se de uma vitória de Bolsoanaro e da sua base conservadora no Congresso, diante de uma oposição que se viu de mãos atadas: votar a favor da PEC, como fez, alegando estar votando em benefício dos mais pobres, ou ser acusada de boicotar uma proposta do desgoverno em favor de 33 milhões de brasileiros que passam fome.

A PEC das Bondades seria capaz de alavancar a candidatura de Sua Excelência à reeleição, tornando-o minimamente competitivo face o avanço de Lula? Especialistas no dinamismo dos cenários eleitorais acreditam que não. Primeiro, o Auxílio Brasil é pago a um contingente de 18 milhões de famílias, mais concentradas no Nordeste – não nas regiões metropolitanas do Sudeste, onde será maior a disputa eleitoral. Segundo, o valor de R$ 600,00 será liberado por família e não por indivíduo, reduzindo o impacto político-eleitoral do programa. Terceiro, o aumento pode ter chegado tarde demais, quando a rejeição a Bolsonaro já está petrificada.

Os efeitos entre os caminhoneiros e taxistas tenderiam a ser mais positivos. No caso dos caminhoneiros, reforçariam os elos do bolsonarismo com uma de suas bases mais fiéis e impediriam protestos contra a alta do diesel e a eclosão de greves, com desastrosa repercussão no abastecimento por rodovias.

No entanto, Auxílio Brasil turbinado e caminhoneiros apaziguados não serão capazes de domar as duas feras que acuam Bolsonaro: a inflação e a corrupção. A carestia – como se dizia antigamente – irá se manter em dois dígitos, anulando grande parte das bondades do novo Auxílio Brasil. E a corrupção, escancarada com o escândalo no Ministério da Educação, se transformou em marca indelével do bolsonarismo, a ser intensamente explorada na campanha eleitoral.

Não bastasse, há o debate jurídico – já aberto – sobre a decretação do Estado de Emergência que justifica as bondades. A legislação eleitoral proíbe a concessão e a criação do benefício no ano do pleito, à exceção de casos em calamidade e emergência. Para justificar a emergência presente na PEC, o desgoverno alegou a crise dos combustíveis, abrindo as portas para os R$ 41,2 bilhões, a serem gastos sem qualquer planejamento.

É grande a possibilidade de a questão ser judicializada. Contudo, como em episódios anteriores, Bolsonaro não vai recuar, porque sabe que tem boas cartas na mão. Quem tentar impedir que os benefícios aprovados pelo Congresso cheguem nas mãos dos mais pobres será acusado de desumanidade. Isso valerá para ministros do Supremo Tribunal Federal e do Tribunal Superior Eleitoral. Valerá para qualquer adversário na corrida presidencial.

A menos de 100 dias da hora do voto, Jair Bolsonaro tem um desesperado trunfo na mão.

 

  • Ricardo Leitão é Jornalista

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