Tudo dominado !

26/10/21

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Por Ricardo Leitão*

 

 

Era uma vez um economista brasileiro, doutor pela Universidade de Chicago (EUA), um dos berços mundiais do liberalismo econômico, que se destacou por sua capacidade de amealhar milhões. Foi banqueiro, empresário na área educacional, professor universitário, grande investidor em ações e consultor financeiro. Sua fortuna é estimada em R$ 1 bilhão.

Até que um dia, Paulo Guedes, o bilionário liberal de raiz, chegou a Jair Bolsonaro, então nos preparativos para se lançar candidato a presidente da República. O futuro ministro deu a Bolsonaro o que ele não tinha: acesso ao empresariado nacional e internacional, a chamada “turma do dinheiro grosso”. Um interesse comum unia todos: impedir a volta da esquerda ao poder, representada pelo então candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad.

Bolsonaro venceu, a direita exultou e Guedes assumiu o superministério da Economia, resultado das fusões dos extintos Ministérios da Fazenda, Planejamento, e Indústria e Comércio. Tamanha versatilidade lhe valeu o apelido de Posto Ipiranga. Anunciou suas prioridades: redução do papel do Estado; privatizações; reformas administrativa, tributária e fiscal; investimentos em infraestrutura e combate ao desemprego.

Na semana passada, as intenções liberalizantes do doutor por Chicago sofreram mais um golpe. Não bastasse ter fracassado na aprovação, pelo Congresso, de todas as reformas estruturais, foi obrigado pela ala política do governo a defender o “furo do teto” dos gastos públicos. Aprovado em maio de 2016, na administração de Michel Temer, o teto de gastos é uma regra constitucional que limita o aumento da maior parte das despesas federais à inflação do ano anterior.

A nova regra, em discussão no Congresso, prevê uma emenda constitucional que, com base em novo cálculo, abrirá espaço para despesas de R$ 83,6 bilhões no Orçamento de 2022 – um ano eleitoral. Os recursos serão utilizados para pagamento mensal de R$ 400,00 a 17 milhões de pessoas; financiar emendas parlamentares de deputados federais bolsonaristas e projetos de prefeitos aliados. Em protesto, dois dos principais secretários de Guedes, mais seus adjuntos, pediram demissão. Desde o início do governo, são 19 os que entregaram os cargos.

O destino do superministro da Economia no governo é incerto. Ele está perdendo a quebra-de-braço com o Centrão, o ajuntamento mais oportunista do Congresso. Não é direitista, esquerdista ou centrista – é radicalmente governista. Apoiou Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff e Michel Temer. Em 2018, voltou nos dois turnos no petista Fernando Haddad. Na campanha chamava Bolsonaro de fascista: agora, um de seus líderes, o senador Ciro Nogueira, é o ministro da Casa Civil.

O Centrão controla a base de Bolsonaro no Congresso. Arthur Lira, outra liderança do ajuntamento, é o presidente da Câmara dos Deputados. Entre outros, tem o poder de abrir um dos 164 pedidos de impeachment de Bolsonaro – assunto reavivado com o relatório final da CPI da Covid. Nogueira e Lira alertaram Sua Excelência para o risco de derrota em 2022 caso uma iniciativa de amplo alcance social – como o Auxílio Brasil de R$ 400,00 – não seja liberado. Paulo Guedes reagiu e perdeu. O Centrão agora domina a política e a economia, sendo parceiro, nesse último campo, dos desenvolvimentistas, que, no ministério, sempre contestaram as tentativas do superministro de conter gastos.

O desgoverno vai piorar. Dando as cartas na política, qual será o jogo do Centrão na economia, agora que ganhou o direito de sentar à mesa? As primeiras reações do mercado financeiro foram muito ruins: dólar em alta, Bolsa em queda, mais inflação, retirada de investidores estrangeiros. A crise política influencia negativamente a economia que, também em crise e sem rumo, aprofunda a balbúrdia política.

A menos de um ano para as eleições presidenciais de 2022, com 27 milhões de brasileiros passando fome, a tensão volta a crescer.

 

* Ricardo Leitão é jornalista

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