Especial de domingo: Em defesa da democracia, em defesa do golpe

07/08/22

blogfolhadosertao.com.br

 

Por Ricardo Leitão *

 

No próximo dia 11, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, será lida a “Carta às brasileiras e aos brasileiros em defesa do Estado Democrático de Direito”. O documento deverá receber cerca de 1 milhão de assinaturas de representantes de todos os setores da sociedade, de ex-ministros do Supremo Tribunal Federal a líderes sindicais.

 

Em 7 de setembro, data do bicentenário da Proclamação da Independência, Jair Bolsonaro pretende liderar mobilização para que seus seguidores ocupem as ruas das capitais e principais cidades. A menos de um mês das urnas eletrônicas, os militantes irão mais uma vez “denunciar” a fragilidade do equipamento e o risco de fraude no processo eleitoral. Sem dúvida, a maior manobra golpista antes de 2 de outubro ou, como preferem os bolsonaristas, “a verdadeira pesquisa” de como votarão os eleitores.

Os dois dias – 11 de agosto e 7 de setembro – não foram escolhidos por acaso. Em 11 de agosto de 1977, também na Faculdade de Direito da USP, o professor Gofredo da Silva Telles Jr. leu a “Carta aos brasileiros”, documento que marcou o ponto de virada na luta contra a ditadura, no poder desde 1964. Passados 45 anos, seu eixo – a defesa da democracia – continua vivo e atual na carta que será lida no próximo 11 de agosto.

Em 7 de setembro do ano passado, em uma manobra tosca, Bolsonaro discursou em Brasília e São Paulo, afrontando os ministros do Supremo Tribunal Federal e conclamando a população a desobedecer suas decisões. A reação foi péssima, o que não impedirá Sua Excelência repetir agora as ofensas. Deu-se inclusive ao trabalho de conceder uma prévia aos interessados. Em entrevista a uma emissora de rádio gaúcha, afirmou que o ministro Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal, deveria ser investigado pela Polícia Federal por defender a urna eletrônica. Em seguida chamou de “criminosos” o ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral, ministro Luis Roberto Barroso; o atual presidente, ministro Edson Fachin, e o futuro presidente, ministro Alexandre de Moraes. Os três rejeitaram o voto impresso nas próximas eleições, exigido por Bolsonaro.

Entre 11 de agosto e 7 de setembro, e de acordo com as circunstâncias que eclodirão nesse período, o Brasil pode incendiar. Aprofunda-se a consciência de que essa eleição não é uma eleição qualquer, mas uma disputa entre o passado e o futuro, entre a civilização e a barbárie. Para os que querem resgatar o País de um desastre de quatro anos nunca foi tão fácil a escolha. No entanto, a escolha não será unânime e se impõe dialogar, convencer, conquistar – e, se preciso, ocupar as ruas e resistir, como se resistiu na ditadura.

Bolsonaro e seus seguidores irão se opor. Quais as forças que estão de seu lado? Duas importantes representações do empresariado brasileiro – a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) – aderiram à mobilização pró-democracia. Mais de 70 instituições assinaram documentos e divulgaram notas oficiais criticando a palestra dada por Sua Excelência a embaixadores estrangeiros, quando afirmou não ser de confiança o sistema eleitoral brasileiro. A Igreja Católica se somou ao protesto, assim como os principais veículos de comunicação. As Forças Armadas, por declarações do ministro da Defesa, reiteraram o cumprimento dos seus deveres constitucionais. No plano internacional, nenhum país relevante apoia rupturas institucionais no Brasil.

Na vida real – onde tentam sobreviver 33 milhões de brasileiros famintos – Jair Messias Bolsonaro está cada vez mais isolado. Contudo, ele irá aos limites para se manter no poder. Se não for pela escolha democrática dos eleitores ou pelo golpe, outra opção cozinha na panela do casuísmo: ser senador vitalício. Temperada nos porões da direita, o cargo lhe garantiria imunidade parlamentar pelo resto da vida, permitindo que escape dos processos na justiça comum, que o alcançariam após a saída da presidência.

Vale tudo, porém o que vale menos é o respeito à Constituição e ao Estado Democrático de Direito. O que vale mais é o delírio e a obsessão desatinada pelo poder. É delírio pensar que, ao contrário do que aconteceu em todas as eleições presidenciais anteriores, haveria ainda possibilidade de superar Luiz Inácio Lula da Silva, líder em todas as pesquisas eleitorais, em um mês e meio de campanha. Como também é delírio cogitar que, depois de 37 anos de uma democracia conquistada com sangue, suor e lágrimas, a grande maioria dos brasileiros irá apoiar outro golpe.

Com certeza, não apoiará. Contudo, é urgente estar atento e forte. Pior presidente da história do Brasil, líder de um desgoverno que destroçou o País, Jair Bolsonaro não se incomodará em incluir em seu incomparável currículo o título de golpista fracassado.

 

  • Ricardo Leitão é Jornalista

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