Câmara já gastou mais de R$ 2,8 milhões com deputados presos desde 2013

30/04/24

Por Juliano Galisi

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Valores incluem salários, verbas de gabinete e cota parlamentar a deputados detidos, como é o caso de Chiquinho Brazão, acusado de ser o mandante da morte da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes

A prisão de deputados federais já custou à Câmara mais de R$ 2,8 milhões em dinheiro público. Esta é a soma, em valores nominais, dos benefícios pagos pela Casa a parlamentares que não tiveram os pagamentos de salário, verbas de gabinete e cota parlamentar suspensos durante o período em que estiveram detidos em regime fechado ou prisão domiciliar desde 2013. Considerando os seis deputados federais presos na última década, a Câmara já pagou R$ 2.836.751 a deputados virtualmente impedidos de exercer a atividade parlamentar.

Os benefícios aos quais um deputado federal têm direito não são revogados tão logo o parlamentar seja preso. Só há a suspensão dos pagamentos em caso de cassação do mandato ou por determinação da Mesa Diretora. Os vencimentos são mantidos até que haja alguma disposição em contrário, mesmo que o deputado esteja virtualmente impedido de trabalhar. A única penalidade ao parlamentar preso, na prática, é o desconto de um trinta avos do salário a cada “ausência não justificada”.

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A Constituição Federal de 1988 instituiu novas regras para a prisão de parlamentares no exercício do mandato. O primeiro caso com a vigência da atual Constituição aconteceu em 2013, com o ex-deputado federal Natan Donadon. Ele foi condenado em 2010 por peculato e formação de quadrilha, mas recorreu da decisão e postergou em três anos o início do cumprimento da pena. Em 28 de junho de 2013, o deputado foi preso por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF).

Dias depois, em 9 de julho, a Mesa Diretora suspendeu os benefícios a Donadon. Mesmo preso, o sistema da Câmara aponta que, em julho de 2013, houve o pagamento de R$ 20.942,58 ao deputado, a título de verba de gabinete. Além disso, de julho a agosto daquele ano, as despesas de cota parlamentar de Donadon somam R$ 944,66.

Uma representação contra Donadon foi instaurada no Conselho de Ética da Câmara e chegou à votação do plenário em 28 de agosto. Houve 233 votos a favor da cassação, ante 131 contrários e 41 abstenções. Como eram necessários ao menos 257 votos para que o parlamentar fosse cassado, o mandato foi mantido. Mesmo assim, Henrique Alves (PMDB-RN), então presidente da Casa, afastou Donadon e convocou o suplente. Meses depois, em fevereiro de 2014, o mandato de Natan Donadon foi cassado de forma definitiva. A pena do ex-deputado foi perdoada em 2017, com o indulto natalino do então presidente Michel Temer (MDB)

Celso Jacob

Preso na Papuda, Celso Jacob (PMDB-RJ) trabalhou normalmente no Congresso em 2017 e 2018
Foto: Dida Sampaio/Estadão / Estadão

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Um membro da Câmara só voltaria a ser preso durante o exercício do mandato em 2017. Celso Jacob foi condenado por fraude em uma licitação durante o período em que foi prefeito de Três Rios, no Rio de Janeiro. Em maio daquele ano, houve o esgotamento dos recursos na Justiça e o STF ordenou que o então deputado começasse a cumprir a pena imediatamente. Em 6 de junho, Jacob foi preso pela Polícia Federal (PF).

Ele permaneceu detido até o dia 27 daquele mês, quando obteve autorização da Justiça para cumprir a pena no semiaberto. Mesmo detido em regime fechado durante três semanas do mês, os benefícios de junho foram pagos normalmente pela Câmara: R$ 33 mil em salário bruto, R$ 97.463,82 em verba de gabinete e R$ 1.891,29 de cota parlamentar entre os dias 6 e 22 daquele mês – ou seja, já excluído do cálculo o período em que o deputado estava solto.

Jacob passou o segundo semestre daquele ano cumprindo a pena em regime semiaberto: de dia, ele comparecia à Câmara e exercia o mandato; à noite, dormia no Complexo da Papuda, em Brasília (DF). Essa rotina perdurou até novembro, quando o deputado foi flagrado tentando entrar na cadeia com biscoitos e queijos escondidos na roupa íntima. Ele acabou sendo punido, indo para a ala solitária do presídio. Em paralelo, no dia 24 de novembro, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) suspendeu a medida judicial que o autorizava a exercer o mandato enquanto cumpria a pena.

Em dezembro de 2017, a Câmara passaria a ter dois membros presos por determinação do STF. Em maio, Paulo Maluf foi condenado pelo Supremo por lavagem de dinheiro durante o período em que foi prefeito de São Paulo. Os recursos foram esgotados no último mês do ano e o ministro Edson Fachin determinou o início imediato do cumprimento da pena.

Após Maluf se entregar à Polícia Federal, a Diretoria Geral da Câmara suspendeu os vencimentos do ex-governador paulista e de Celso Jacob. Mesmo com os benefícios suspensos, o sistema da Casa aponta que houve pagamentos de verba de gabinete a Maluf e a Jacob enquanto eles estavam presos. Maluf recebeu em R$ 68.699,95 em fevereiro de 2018; Jacob, R$ 3.447,31 em maio daquele ano.

Em fevereiro, Rodrigo Maia (DEM-RJ) afastou Maluf do mandato e convocou o suplente. Quatro meses depois, em junho, Celso Jacob conseguiu uma medida judicial para retornar à Câmara. Paulo Maluf, por outro lado, teve o mandato cassado em agosto.

João Rodrigues foi o primeiro deputado federal detido que continuou a receber os benefícios da Câmara sem disposições em contrário. Condenado por fraude em uma licitação quando foi prefeito de Pinhalzinho (SC), o STF ordenou o cumprimento imediato da pena de Rodrigues em 6 de fevereiro de 2018. Dois dias depois, ele foi detido pela PF. Mesmo preso em regime fechado durante quatro meses, não houve revogação dos benefícios.

Nesse período, o gabinete do deputado custou R$ 481.880,94. O salário bruto, de R$ 33 mil, continuou a ser pago, gerando um ônus de R$ 168.815,00 à Câmara. Deste montante, Rodrigues recebeu, em valores líquidos, R$ 64 mil. Nos meses em que ele esteve preso, também foram pagos ao gabinete R$ 8.564,31, a título de cota parlamentar.

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