Indígena Atikum morre em viatura da Polícia Militar e revolta comunidade em Carnaubeira da Penha

18/06/22

Portal Marco Zero

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Nação Atikum fez protesto ontem   nas ruas de Carnaubeira da Penha e pediu justiça por Edvaldo Manoel de Souza, de 61 anos.

Com as atenções da mídia e do público focadas nos assassinatos do indigenista Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips, a morte de um ancião indígena durante uma abordagem policial no sertão de Pernambuco poderia passar despercebida não fosse a reação imediata do povo atikum.

Edvaldo Manoel de Souza, de 61 anos, morreu após ser interrogado por policiais militares do Grupo de Apoio Tático Itinerante (Gati) no quintal de sua casa, na quarta-feira, dia 15. Assim que a notícia da morte se espalhou, a comunidade atikum iniciou os protestos em Carnaubeira da Penha, a 501 quilômetros do Recife.

Lideranças indígenas e organizações de defesa dos direitos dos indígenas se reuniram hoje, sexta-feira, na aldeia Olho D’água do Padre, onde está sendo velado o corpo do indígena. Segundo os moradores, Edvaldo, um dos anciãos da aldeia, já vinha sendo perseguido pelos agentes que o acusava de possuir uma espingarda de cartucho de forma ilegal.

Os policiais militares lotados na 1ª CIPM que já tinham apreendido uma espingarda de bucha “soca-soca” que pertencia ao senhor para a caça dentro da terra indígena, insistiam em acusá-lo de esconder uma arma de fogo em sua residência. Segundo a cunhada de Edvaldo que presenciou a abordagem realizada, após negar a existência da arma, o senhor teria sido agredido e levado para o “barraquinho”, um barraco no fundo do quintal, onde teria sido pressionado pelos policiais para confessar a posse da espingarda. “Antes de levá-lo para o barraquinho, o primeiro que lhe deu um tapa ameaçou: ‘você já me denunciou. Vá me denunciar de novo?’”, disse sua cunhada, cujo nome será mantido em reserva.

De acordo com os PMs, o indígena, que era hipertenso, teria desmaiado durante o interrogatório devido a falta de remédio de pressão. Foi levado em uma viatura para a unidade de saúde da cidade, onde chegou morto. “Toda vez que o Gati entra na reserva ele faz esse trabalho fora da lei. Batendo nos indígenas quando eles querem informações. E não importa se é mulher, criança ou homem, é com brutalidade. É ação sem mandato, invasão! Não foi a primeira vez que batem em Edvaldo, e ele já tinha denunciado as agressões passadas na delegacia. E então retornaram dias depois e espancaram ele novamente”, relatou Clóvis Atikum, cacique da Aldeia.

Na manhã da quinta-feira (16) aproximadamente 300 indígenas saíram da aldeia em protesto pelas ruas da cidade até a delegacia cobrando justiça pela morte de Edvaldo. O ato pacífico contou com cartazes, cantos, danças e com a esposa, filhos e netos do senhor. Foi entregue na unidade um abaixo assinado exigindo uma investigação eficiente sobre o caso, e o boletim de ocorrência registrado pelos policiais que interrogaram e socorreram Edvaldo. O documento oculta dados importantes do ocorrido como o nome do agressor, que foi registrado como “Desconhecido (autor/agente)”, e as agressões sofridas pelo indígena.

De acordo com o cacique da aldeia, os agentes tentaram convencer a médica da unidade de saúde a registrar a chegada de Edvaldo com vida, mas ela se negou a mentir no registro. Após a constatação da morte, o corpo foi levado para Petrolina, onde foi analisado pelo Instituto de Medicina Legal (IML), e retornou para o funeral na aldeia. O laudo do IML ainda não foi liberado. “É o terceiro indígena assassinado na reserva pela polícia. O primeiro foi há cinco anos atrás, o caso foi pra corregedoria. O segundo foi há dois anos atrás. E agora, este”, afirmou cacique Clóvis.

Os indígenas encaminharam o caso para a Fundação Nacional do Índio (Funai), em Paulo Afonso, na Bahia, e para a Secretaria de Direitos Humanos de Pernambuco, e aguardam as providências a serem tomadas. “Queremos justiça, e uma resposta rápida. Precisamos discutir essa forma de trabalho da polícia dentro do nosso território. Não somos contra a entrada da polícia na nossa terra, a polícia é pra nos proteger, mas com essa forma de abordagem, com isso nós não concordamos”, queixou-se o líder indígena.

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