13/12/20
+ Por Italo Rocha Leitão
Quando A.J.S., 17 anos, chegou na sua humilde casa, num bairro da periferia do Recife, foi saudado pela vizinhança como popstar. Tinha acabado de desembarcar no Aeroporto dos Guararapes depois de seis meses de intercâmbio nos Estados Unidos. “Tás parecendo um americano” – disse um amigo da mesma idade. Um outro emendou a piada: “Diz aí um palavrão em inglês”.
Por trás da brincadeira dos colegas, existia um desconhecimento de quanto o amigo e vizinho tinha ralado para conseguir tamanha façanha. Filho de uma dona de casa e de um pedreiro, era aluno de uma escola pública do estado e, ao iniciar os estudos, jamais imaginava que um dia iria ter condições de ir tão longe na vida e estudar em outro país. O pai não tinha tido, o avô também não e, assim como em Vidas secas, de Graciliano Ramos, “para trás não existia mais família”.
A.J.S. estava ali naquela rua pobre e sem calçamento depois de ter passado um semestre estudando inglês numa escola no interior dos EUA como integrante do programa Ganhe o Mundo. Mas, a ida dele não foi um presente dos céus. Durante o ensino médio, gastou as pestanas na sala de aula e em casa para manter a média em matemática, português, inglês e não ser reprovado em nenhuma outra disciplina. Exigências inegociáveis para se inscrever no programa e tentar uma vaga de intercambista.
Em qualquer governo, as obras físicas são sempre as mais lembradas porque ganham um destaque maior na mídia com direito a textos, fotos e imagens que se tornam perenes no consciente coletivo – é o que se chama popularmente de “obras de pedra e cal”. O programa “Ganhe o Mundo” é o que podemos classificar de “obras abstratas”, ninguém sabe, ninguém vê. Criado no início do segundo governo de Eduardo Campos e ampliado no governo de Paulo Câmara, é considerado o programa mais inclusivo da área educacional da história de Pernambuco. O Ganhe o Mundo já fez com que mais de 9 mil estudantes de escolas públicas estaduais criassem asas e voassem para países da Europa, da América do Sul e da América do Norte para aprender a falar definitivamente inglês ou espanhol. Um plus na vida de qualquer estudante e até então uma prerrogativa apenas das famílias abastadas.
Os classificados no Ganhe o Mundo, todos filhos de pais pobres, recebem do governo ajuda de custo mensal durante o intercâmbio, hospedagem e alimentação gratuitas e, na volta, competitividade para ingressar nos setores do mercado de trabalho que têm exigência de domínio em inglês ou espanhol.
A.J.S., quando voltou para o seu recanto, se tornou voluntário e deu aula do novo idioma que aprendeu para os amigos pobres do seu bairro. Atualmente, ganha a vida como professor de inglês.
+Italo Rocha Leitão é jornalista