Simone Tebet: “Sobrevivemos ao ano mais difícil”

17/11/25

Estadão Conteúdo

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Em entrevista, a ministra do Planejamento e Orçamento fala sobre os desafios fiscais do governo Lula até agora e as perspectivas para frente

A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, disse que a discussão sobre mirar o centro ou o piso da meta fiscal está encerrada e com o apoio do Congresso Nacional, que explicitou na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) a liberação para não se contingenciar pelo centro da meta.

“Ele [relator] já fez uma alteração na LDO, deixando claro que a gente mira o centro, mas, para efeito de corte, a gente tem outras ferramentas, o próprio faseamento e a própria lei determinam que a gente tenha que mirar o piso. Não podemos contingenciar quando tem expectativa de que vamos cumprir a meta”, afirmou.

Em entrevista às margens da Cúpula das Nações Unidas para Mudanças climáticas, a COP30 em Belém (PA), ela também afirmou que o governo não pretende alterar a meta fiscal para 2026 e nem mandar novos projetos com impacto fiscal para o Congresso no ano que vem, otimista com a aprovação de medidas que turbinem a arrecadação ainda em 2025.

Tebet também disse que já está na hora de ver refletido em redução da taxa básica de juros o trabalho bem feito, segundo ela, do governo e do Banco Central. Ela disse que a expectativa da equipe econômica é que a autoridade monetária comece a cortar a Selic em janeiro.

Segundo ela, o presidente do BC, Gabriel Galípolo, já mostrou ter racionalidade e uma visão global de Brasil, mas que ele também tem sensibilidade e é o momento de mostrar esse seu lado para começar a reduzir a taxa de juros.

Leia os principais trechos da entrevista:

Estamos discutindo o Orçamento de 2026 e tem essa dúvida sobre onde mirar na meta fiscal, se a gente vai mirar no piso, ou no centro… Tem uma discussão com o TCU, o relator tirou esse trecho. Vocês vão botar de novo essa coisa explícita de seguir o piso da meta?

TEBET- Ele [relator] já fez uma alteração na LDO, deixando claro que a gente mira o centro, mas para efeito de corte, seja bloqueio ou contingenciamento, nesse caso específico, contingenciamento, a gente tem outras ferramentas, próprio faseamento e a própria lei determina que a gente tenha que mirar o piso. A gente não pode contingenciar quando tem expectativa de que a gente vai cumprir a meta.

O ministro Fernando Haddad falou que tem muito dinheiro empoçado e que isso deve fazer com que o resultado primário no final do ano seja melhor…

TEBET- Sempre tem, nós tivemos muitos investimentos no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), então você tem problema com o Tribunal de Contas, recurso de empreiteira que, no processo de licitação, quem fica em segundo lugar, tende a recorrer. Há outras obras que são paralisadas em período de chuva, então o cronograma de trabalho dessa obra fica prejudicado.

E aí isso deve fazer com que o resultado primário fique mais perto do centro do que do piso da meta? Porque o que o TCU estava falando aqui na COP mesmo era que não pode considerar empoçamento para a análise da meta.

É análise, é o papel deles. Ele analisa isso. Mas a equipe econômica pensa o orçamento de forma anual. Nós temos consciência que o orçamento é anual, que nós precisamos entregar até dezembro deste ano a meta fiscal cumprida.

A senhora acha que já está resolvida essa discussão sobre para onde mirar, isso é passado?

TEBET- Eu não tenho dúvida disso. Com apoio do Congresso Nacional, como nós acabamos de ter com alteração do dispositivo da LDO.

Para o ano que vem a meta fiscal vai dar para bater?

TEBET- Nós não vamos mudar a meta, não há nenhuma discussão, não há nenhuma necessidade. O Congresso tem sido parceiro na aprovação das receitas que precisamos, que a gente chama, e é realmente dessa forma que precisamos chamar, que é justiça tributária. Não podemos não cobrar dividendos, não cobrar de bets dentro da média. Temos as bets, temos fintechs, temos dividendos, temos muita coisa sendo discutida, o diálogo tem sido muito frutífero [no Congresso].

Então a senhora está otimista com passar tudo isso este ano para manter a meta do ano que vem?

TEBET – Nós sobrevivemos ao ano mais difícil que todo mundo tinha dúvida, que era 2025. Era o ano decisivo para mostrar se teríamos ou não condições de garantir o arcabouço fiscal em pé e cumprimento de meta. Nós estamos comprovando em 2025 que foi possível, é o ano mais difícil. 2026 não tem graça, como todo mundo está falando.

Ninguém vai mandar nada para o Congresso Nacional em 2026. Não é só porque não passaria, porque não temos mesmo nenhum projeto para ser apresentado no ano que vem. É um ano curto, pensando em eleição em outubro. De outubro até o final do ano, é fechar conta, enxugar, organizar a máquina, entregar redondinho o cumprimento da meta fiscal para 2027.

Ministra, nesta terça-feira saiu a inflação. Eu vi que a senhora comemorou. Como que a senhora viu esse resultado?

TEBET- Chegando para o centro da meta. Nós temos que trabalhar com período de 12 meses, mas se a gente trabalhasse só o período do ano de 2025, nós já estaríamos dentro da meta. Ela vem num decrescente, numa desaceleração. Então nós estamos muito otimistas que, não só o trabalho do Banco Central já surtiu o efeito, mas o trabalho também da equipe econômica e do próprio Congresso Nacional.

O que o governo teve que fazer para ter esse efeito?

TEBET- Há uma série de medidas que foram feitas e a gente sempre começa tardiamente a colher frutos. Nós estamos colhendo fruto daquilo que fizemos nos últimos oito anos. Nós estamos colhendo fruto daquilo que fizemos nesses três anos. Enfrentando o desafio que sempre diziam: o arcabouço não para em pé, não vai se sustentar, não vai cumprir meta e ainda que, com toda dificuldade, nós estamos conseguindo garantir credibilidade e segurança jurídica.

Isso para pelo que?

TEBET – A própria saída para os precatórios, que foi uma invenção do Ministério do Planejamento e do Orçamento, porque era saída possível, dentro de um processo, garantiu segurança para que, em 2027, especialmente 2028, a gente não tivesse um shutdown Então, aquela questão do arcabouço não se sustentar a partir de 2027, 2028, ele não se sustentava. Está praticamente resolvido, porque nós conseguimos reintroduzir os precatórios.

Agora já está na hora de colher esses frutos na Selic?

TEBET- Eu não tenho dúvida disso. Agora com a palavra o Banco Central. O Banco Central tem autonomia. Eu respeito essa autonomia. Votei favorável, inclusive. Sei da capacidade do presidente Galípolo, agora nós queremos ver aquilo que eu também sei que ele tem, que é a sensibilidade. Até agora, ele teve que ser racional e não podia ser diferente.

Agora eu tenho certeza que ele vai agir no racional com a sensibilidade que ele tem e é muito particular. Ele tem uma visão estratégica e global de Brasil e sabe que, como os juros estão muito altos, não vai ser uma queda paulatina e lenta a partir de janeiro, ou antecipar um pouco, que vai poder gerar inflação.

A senhora espera uma queda de juros já no fim deste ano?

TEBET- No fim deste ano eu não acredito. Não acredito que esteja no radar do Banco Central e nem do mercado, nem da equipe econômica, mas, a partir de janeiro, é a nossa expectativa.

Ministra, COP30, o maior desafio que as pessoas estão discutindo aqui na COP30 é como fazer o combate às mudanças climáticas caberem no orçamento. Como que vocês estão pensando, enquanto Brasil, para colocar o combate às mudanças climáticas no orçamento?

TEBET- Eu acho que há um equívoco. O maior desafio da COP30 ou do combate ao aquecimento global não é o orçamento. Não há país no mundo que tem o orçamento suficiente para sozinho resolver o problema das mudanças climáticas, preservação das suas florestas, os seus mares, os seus biomas, enfim, terra, mar, água e ar. Não há país no mundo que dê conta do seu próprio orçamento. Nós precisamos de doações, subvenções, financiamento, parcerias público-privadas e apoio em expertise técnica.

Como que entra o Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF na sigla em inglês) nessa história? A senhora acha que é um modelo para finalmente quebrar essa dependência de doações, de esperar a boa vontade dos países ricos?

TEBET- É uma engenharia extremamente inteligente. A grande questão aí é, como tudo que é novo, ele gera desconfiança. Então, uma boa modelagem de governança como foi feita, foi fundamental. O que falta agora, e é um processo, acabou de começar, já é um sucesso, apesar da desconfiança, é mostrar, é vender esse produto. Um produto que tem não só uma engenharia inteligente na formação, mas uma excelente governança. A gente ficou positivamente surpreendido com o valor inicial já portado. É um processo de 2 anos, é um processo de 3 anos, mas que veio para ficar, não há outra alternativa para o planeta.

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