06/07/25
Raphael Guerra
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Levantamento do TCE-PE identificou ainda que mais de 93% das 184 cidades não contam com casa-abrigo para as vítimas de violência doméstica

Apesar do aumento das campanhas de conscientização e prevenção sobre a violência contra a mulher, muitas vítimas ainda se sentem inseguras em procurar a polícia para denunciar seus agressores. E um dos principais motivos é a falta de uma rede de proteção para acolhê-las e garantir a proteção mais adequada.
O levantamento do Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco (TCE-PE) sobre as políticas adotadas pelos municípios na área da segurança pública revelou um dado alarmante. Uma em cada três cidades pernambucanas ainda não tem um órgão voltado à defesa dos direitos da mulher.
Na avaliação de Izabel Santos, coordenadora geral do Centro das Mulheres do Cabo, organização feminina com mais de 40 anos de luta, a pesquisa demonstra que muitos gestores públicos não dão a devida atenção às políticas de prevenção à violência contra a mulher.
Ao todo, no Estado, 62 municípios declararam ao TCE-PE não contarem com órgão ou secretaria voltada à proteção das mulheres.
Izabel também é gestora do Comitê de Monitoramento da Violência e Feminicídio no Território de Suape, que atua em 11 municípios da Mata Sul do Estado com foco na prevenção à violência de gênero.
“A gente vem cobrando do poder público a efetivação dessas políticas. Muitas vezes, as gestoras desses órgãos ficam solitárias para tentar implementar uma política por causa da falta de investimentos. É uma questão de falta de prioridade dos municípios”, disse.
De acordo com estatísticas da Secretaria de Defesa Social (SDS), 23.328 queixas de violência doméstica/familiar foram registradas por mulheres em delegacias de Pernambuco somente entre janeiro e maio deste ano. A média diária é de 155 casos.
Ex-gestora do Departamento de Polícia da Mulher em Pernambuco e presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher na Assembleia Legislativa, a deputada estadual Gleide Ângelo classificou os dados do levantamento do TCE-PE como “graves”.
“Se tem no relatório que um terço dos municípios não possui nenhum organismo de mulher, nenhuma diretoria, nenhuma coordenadoria, isso demonstra que a violência contra a mulher e que a vida da mulher não têm importância. Somente em 2024, tivemos mais de 53 mil boletins de ocorrência de vítimas pedindo ajuda nas delegacias. Isso significa que o problema é real e grave”, declarou.
“A partir do momento que o gestor ou uma gestora municipal fecha os olhos para isso, a partir do momento que não coloca isso como prioridade, você está dizendo o quê? Que você simplesmente acha normal e não se importa com a vida das mulheres no teu município”, complementou.
Gleide reforçou que é preciso cobrar dos prefeitos a implementação dos organismos voltados à proteção da mulher.
“O que a gente vê hoje, infelizmente, e isso nos envergonha como pernambucanos e pernambucanas, é que a mulher tem somente duas opções: ou ficar numa relação abusiva, apanhando até morrer, ou sair de uma relação abusiva e ser assassinada porque o agressor não aceita. Ela precisa ter o direito de escolher, sair a hora que quiser [da relação] e o Estado e o município têm a obrigação de proteger e acolher essa mulher”, pontuou.
SÓ 12 CIDADES TÊM ABRIGO PARA MULHERES VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA
Apesar de 67% dos municípios pernambucanos contarem com algum órgão voltado às mulheres, a rede de proteção em muitos deles é precária. A pesquisa do TCE-PE indicou que apenas 12 cidades têm casa-abrigo para receber as vítimas de violência doméstica, ou seja, 93% não contam com esse equipamento tão necessário.
“A Lei Maria da Penha está completando 19 anos. E ela propõe a criação desses equipamentos, mas as cidades ainda deixam muito a desejar. Precisamos de um maior investimento, mais orçamentos para essa política no âmbito municipal, estadual e também nacional. É preciso mais apoio para que as mulheres possam denunciar e evitar o feminicídio, que a gente vem acompanhando o crescimento”, enfatizou Izabel Santos.
Em Pernambuco, 41 casos de feminicídio foram registrados oficialmente somente entre janeiro e maio deste ano. Foram sete óbitos a mais em comparação com o mesmo período de 2024.
Gleide Ângelo destacou a importância da casa-abrigo após o registro da denúncia de violência.
“É aquele lugar que a mulher vai ser retirada do risco. Ela vai permanecer lá até que o agressor seja preso, até ter uma solução para ela. O que não pode é a mulher ir na delegacia, registrar o boletim de ocorrência e voltar para casa para correr risco real de morte. Tudo isso precisa ser urgentemente modificado.”
ESTADO DIZ QUE ESTÁ AJUDANDO MUNICÍPIOS
Questionada pelo JC, a secretária da Mulher de Pernambuco, Juliana Gouveia, declarou que o Estado tem ajudado os municípios com capacitações e entrega de materiais para campanhas e melhoria das estruturas.
“Além das formações continuadas para todas as gestoras de Pernambuco, há o fortalecimento das campanhas de prevenção à violência contra a mulher, através de material gráfico entregue aos municípios. No mês de março e abril, realizamos campanhas de forma presencial em todas as cidades”, disse.
Segundo ela, recentemente 182 municípios receberam kits de mobiliário para fortalecimento dos organismos de política para a mulher.
“Mesas, cadeiras, armários e computadores foram entregues. A gente também está efetivando a compra de automóveis que vão ser entregues no segundo semestre para todos os organismos de políticas públicas para mulher no Estado”, afirmou.