Caso Marielle: emoção marca julgamento de assassinos confessos da vereadora e do motorista Anderson Gomes

31/10/24

Agência O Globo

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Testemunhas e pessoas que assistiram depoimentos de familiares das vítimas e da sobreviventes de atentado choraram em alguns momentos
Marinete Silva, mãe de Marielle Franco, em depoimento no TJRJ
O julgamento Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz, assassinos confessos da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes, que acontece nesta quarta-feira no 4º Tribunal do Júri, no Centro do Rio, foi marcado por depoimentos emocionados das famílias das vítimas e Fernanda Chaves, a única sobrevivente do atentado do dia 13 de março de 2018. Testemunhas e pessoas que assistem ao júri chegaram a chorar em alguns momentos.

Além de Fernanda, foram ouvidas Marinete da Silva, mãe de Marielle; a vereadora Monica Benício, viúva da parlamentar; e Agatha Arnaus Reis, viúva de Anderson. Na primeira fileira de cadeiras do plenário, estão a filha de Marielle, Luyara, seguida da ministra da Igualdade Racial Anielle Franco e de Antônio da Silva, irmã e pai da parlamentar assassinada.

Seguem alguns dos momentos emocionantes do julgamento:

“Nem quando ela morreu, ela parou”
Primeira testemunha a depor, Fernanda Chaves, então assessora da parlamentar que estava no carro no momento do ataque, participou do julgamento por videoconferência.

— Nem quando ela morreu, ela parou. É muito difícil, nessas manifestações que tem que dizer “Marielle vive”, eu sinto um negócio atravessado e quase não consigo. Porque ela não vive. Ela não está aqui, eu não posso abraçar, não posso sentir o cheiro dela. É dolorido demais. Mas, ao mesmo tempo, o que a Marielle significa, o que ela é de essência, está no mundo inteiro. Essas pessoas que pensaram, que desejaram interromper Marielle, elas não conseguiram interromper. Elas tiraram a Marielle da gente, mas elas não conseguiram interromper o que significa Marielle — disse Fernanda.

“14 de março nunca saiu de dentro da gente”
Fernanda relatou, no Tribunal do Júri, o impacto emocional do crime em sua vida e de sua família. Ela foi obrigada a sair do Brasil por segurança, e não pode participar do velório e dos ritos de despedida da amiga.

— 14 de março nunca saiu de dentro da gente. Foi muito doloroso para mim. Muito mais doloroso foi não participar dos ritos de despedida da Marielle — disse Fernanda.

“Fico imaginando que alguém foi pago para matar minha filha”
A mãe de Marielle, Marinete, foi a segunda testemunha a depor. Logo no início, ela se mostrou muito emocionada e chorou. “Só quero uma condenação justa”, disse. Luyara e Anielle também choram ao ouvir o depoimento. A irmã da vereadora não contém as lágrimas ao ouvir um áudio apresentado em que Marielle pede bênção.

— Não estou para falar da minha filha como parlamentar. Estou como mãe. Ela lutou muito: estudou e chegou onde chegou. Aquilo (crime) foi uma barbárie. Nenhuma mãe merece perder a filha desse jeito… Quero pedir justiça por Marielle e Anderson — disse Marinete. — Fico imaginando que alguém foi pago para matar minha filha.

“Um coração que tem um pedaço que foi arrancado covardemente”

Descrevendo a vereadora assassinada como “boa mãe” e “excelente filha”, Marinete Silva relatou ainda ter precisado, após o assassinado da filha tratar de um câncer nesse período, fazendo quatro cirurgias:

— Cada vez mais dói, dói muito. Imagine que dói para a Ani, dói para a Luyara. Perder uma mãe, como a Luyara perdeu, nunca passou em nossa mente o que aconteceu com a minha filhar. É uma falta, um vazio, um coração que tem um pedaço que foi arrancado covardemente, injustamente, naquele noite de 14 de março de 2018.

Um vídeo foi exibido durante o julgamento, de um documentário, que regatava até áudios de Marielle à família. Em uma das mensagens, a vereadora pedia a bênção à mãe, momento em que Anielle Franco desabou em lágrimas. Marinete também usou as mãos para limpar o rosto, após as lágrimas.

“Quando a Marielle morreu, eu senti que tinham tirado a promessa do futuro”
A viúva Monica Benicio foi a terceira a prestar depoimento. Também muito emocionada, ela falou da atuação de Marielle, sem conter o choro, em momentos de silêncio.

— Era uma das pessoas mais companheiras que eu conheci. E acho que no sentido mais generoso e bonito que isso pode ter — disse, após uma longa pausa.

Perguntada sobre como Marielle agia profissionalmente, Monica disse que Marielle estava no momento mais feliz da vida dela. profissional e emocionalmente. Segundo Monica, as duas tinham planos de se casar no ano seguinte ao do assassinato da parlamentar.

— Quando a Marielle morreu, eu senti que tinham tirado a promessa do futuro.

“Passei os últimos 2.422 dias lutando para que isso (o julgamento) acontecesse”
Antes do início do julgamento, a viúva da vereadora assassinada publicou na sua página no Instagram um desabafo. Fala em “tortura” pela espera de seis anos por respostas sobre o atentado. Cita fala idas a “inúmeros países, incontáveis cidades”, além do contato com “milhares de pessoas”.

“Passei os últimos 2.422 dias lutando para que isso (o julgameto) acontecesse”, disse Monica no post.

Na publicação, Monica usou uma foto em que está sozinha, usando o adesivo de campanha, com o número usado por Marielle nas urnas, além de um broche estampado com a frase “Marielle presente!”.

“Ele (Arthur) viveu uma vida com uma mãe destruída”
Quarta testemunha a ser ouvida, a viúva de Anderson, Ágatha Reis falou sobre a ausência do marido nos anos após o assassinato e das dificuldades enfrentadas, agora sem ele, na criação do filho Arthur, que tinha um ano e dez meses na época da morte do pai.

No plenário, o público que assistia ao julgamento se emocionou com o vídeo de Anderson. Diante das primeiras imagens, que mostram as brincadeiras e risos entre o casal em meio ao anúncio da gravidez do único filho, alguns sorriram, emocionados. A sequência de imagens, no entanto, que mostram o motorista com o filho, foi de choro e muita emoção para quase todos os convidados das famílias das duas vítimas.

— A primeira coisa que Arthur falou foi “papai” — recordou Ágatha.

A viúva disse não saber se Arthur tem toda a compreensão da morte do pai.

— Ele viveu uma vida com uma mãe destruída. Ele não andava, não falava. Ele perdeu todos os Dias dos Pais, as festas da família. Não teve oportunidade de um momento tranquilo com o pai — disse.

“Não vai passar nunca, porque sempre vai ter alguma coisa sem o Anderson”
Agatha lembrou ainda uma frase que o pai dela disse, em determinado momento, que tudo o que fizesse a partir dali seria a primeira vez sem o Anderson.

— Acho que eu quis acelerar muito também, para fazer tudo rápido. Vai doer rápido, logo, de uma vez. (Mas) Não vai passar nunca, porque sempre vai ter alguma coisa sem o Anderson. A primeira vez que o Arthur andou, que falou “mamãe”, uma escola nova, um coleguinha. Sempre vai ter — afirmou, com a voz embargada.

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