06/11/21
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Sucesso nas rádios e no streaming, cantora trouxe no cerne de sua música um sofrimento feminino que atravessa a história da música popular
Marília Mendonça em show em São José dos Campos (SP), em 25 de setembro. – FOTO: WILL DIAS/ESTADÃO CONTEÚDO
Nascida em Cristianópolis, mas criada na capital Goiânia, começou compor quando tinha 12 anos de idade, passando a escrever para vários cantores da música sertaneja. Com pouca idade, foi galgando espaço, ganhando apoio de nomes como Henrique & Juliano, que foram os seus padrinhos na música.
Com apenas 20 anos, sentada em um cenário de barzinho para gravar o seu primeiro DVD, conquistou o país com temática de traição e voz grave. Bastava alguns segundos para notar que Marília cantava com a alma. “Infiel” foi a segunda canção mais executada nas rádios do Brasil em 2015. Seguiram sucessos como “Eu Sei de Cor”, “Amante Não Tem Lar”, entre tantos outros, inúmeros para uma carreira interrompida. Logo se tornou a mais tocada, das rádios ao streaming.
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O sertanejo já havia entrando há alguns anos em seu momento “universitário”, um movimento natural para conquistar novas gerações e renovar o mercado com estéticas mais contemporâneas, mas Marília trazia um novo tempero. Tinha uma voz marcante, composições autorais que geravam grande identificação, sempre com uma perspectiva feminina. Sobretudo, impunha a figura da uma mulher firme.
O “feminejo” logo começou a brotar na imprensa, sendo Marília a principal representante. Na esteira, ascenderam nomes como Maiara & Maraísa, Simone & Simaria, Naiara Azevedo, entre outras. O termo logo perdeu usabilidade, pois a figura feminina foi naturalizada no segmento, muito por conta de Marília.
O seu impacto respingou em vários gêneros, como no forró, que sempre caminhou junto com o sertanejo. Mas Marília foi além: conquistou admiração no pop, no funk e até na MPB, que no passado demonstrava certo preconceito. Caetano Veloso, por exemplo, a cita em “Sem Samba Não Dá”, do novíssimo “Meu Coco”. Com Gal Costa, ela gravou “Cuidando de Longe”.
Acima de qualquer chancela, ela foi uma artista amplamente popular, que agradava das domésticas aos jovens de classe média. Atraiu até pessoas LGBTQIA+, que antes não se identificavam com a virilidade dos cantores. No âmbito da diversidade, era aberta ao diálogo. Quando fez um comentário problemático sobre pessoas trans durante live na pandemia, admitiu o erro e pediu desculpas. Contrariando grande parte do sertanejo, se posicionou contra Jair Bolsonaro nas eleições e recebeu muitas críticas.
Em 2019, tocou uma iniciativa megalomaníaca que só poderia ser realizada por um nome de peso, em qualquer lugar do mundo: realizou shows gratuitos e surpresas em espaços públicos de diferentes capitais do país, resultando no DVD “Todos os Cantos”. Em Pernambuco, cantou com o projeto na Avenida Rio Branco, no Bairro do Recife, registrando no DVD a canção “Passa Mal”. Antes, pela tarde, foi vista distribuindo panfletos e tirando fotos com quem passava.
Aclamada como a “rainha da sofrência”, Marília Mendonça realmente fez a sofrência dos nossos tempos. Trazia no cerne da sua música o sofrimento feminino que atravessa da música brasileira. É o sofrer de Núbia Lafayette, Dalva de Oliveira e Maysa Matarazzo.
“Se amar assim for brega / Me chama de Marília Mendonça ou de Falcão”, cantava, em “Serenata”. “Eu sei que é brega. Eu sou brega com muito orgulho”. De fato, quando amamos, somos todos bregas e, no melhor dos sentidos, gostamos de sofrer.