23/03/21
Por Central de Notícias/blogfolhadosdertao.com.br
Em uma das maiores derrotas da história da Lava Jato, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu nesta terça-feira (23) que o ex-juiz federal Sérgio Moro (foto) foi parcial ao condenar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na ação do triplex do Guarujá. O placar sofreu uma reviravolta com a mudança na posição da ministra Cármen Lúcia, que alterou o voto proferido em dezembro de 2018. Com o entendimento da Segunda Turma, o caso agora terá de voltar à estaca zero.
“Neste caso o que se discute basicamente é algo que para mim é basilar: todo mundo tem o direito a um julgamento justo e ao devido processo legal e à imparcialidade do julgador”, disse Cármen Lúcia, ao iniciar a leitura do voto. A ministra buscou restringir o entendimento à questão específica de Lula na ação do triplex, tentando delimitar os efeitos do julgamento. Um dos temores de investigadores é que a declaração da suspeição de Moro provoque um efeito cascata, contaminando outros processos da operação que também contaram com a atuação do ex-juiz.
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“Tenho para mim que estamos julgando um habeas corpus de um paciente que comprovou haver estar numa situação específica. Não acho que o procedimento se estenda a quem quer que seja, que a imparcialidade se estenda a quem quer que seja ou atinja outros procedimentos. Porque aqui estou tomando em consideração algo que foi comprovado pelo impetrante relativo a este paciente, nesta condição. Essa peculiar e exclusiva situação do paciente neste habeas corpus faz com que eu me atenha a este julgamento, a esta singular condição demonstrada relativamente ao comportamento do juiz processante em relação a este paciente”, acrescentou Cármen.
O entendimento da Segunda Turma do STF marca um dos maiores reveses da história da Lava Jato no STF, que já derrubou as conduções coercitivas e a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância, dois dos principais pilares da operação.
Em seu novo voto, Cármen Lúcia criticou a “espetacularização” da condução coercitiva de Lula, determinada por Moro em março de 2016; a quebra do sigilo telefônico de advogados que atuaram na defesa do petista; a divulgação de áudio entre Lula e a ex-presidente Dilma Rousseff envolvendo a nomeação do petista para a Casa Civil; e o levantamento do sigilo da delação premiada do ex-ministro Antonio Palocci durante a campanha eleitoral de 2018. Para a ministra, esses episódios “maculam” a atuação do ex-juiz federal da Lava Jato.
“Não estou emitindo juízo no voto sobre o combate a corrupção, que não pode de jeito nenhum parar”, frisou Cármen Lúcia.
Cármen se alinhou aos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski, que votaram no início deste mês para acolher o pedido da defesa de Lula e declarar Moro parcial. A ministra, no entanto, abriu uma divergência pontual dos colegas, ao entender que Moro não deve ser condenado a pagar as custas processuais do caso.
A atuação de Moro em outra ação penal que levou à condenação de Lula na Lava Jato (a do sítio de Atibaia) foi menor: coube ao ex-juiz da Lava Jato aceitar a denúncia e colocar o ex-presidente no banco dos réus mais uma vez. A condenação, no entanto, foi assinada pela juíza Gabriela Hardt, depois que o ex-juiz já tinha abandonado a magistratura para assumir o cargo de ministro da Justiça do governo Bolsonaro.
A defesa de Lula deverá pedir a extensão para o processo do sítio de Atibaia, mas a Segunda Turma do STF ainda deverá debater o caso.
Indicado ao STF pelo presidente Jair Bolsonaro, o ministro Kassio Nunes Marques pediu vista (mais tempo para análise) no início do mês, suspendendo a discussão sobre a atuação de Moro ao condenar Lula a nove anos e seis meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro na ação do triplex. Nesta tarde, Nunes Marques surpreendeu ao votar contra o habeas corpus do petista.
Em seu voto, Marques afirmou que o habeas corpus não é o meio processual adequado para alegar a suspeição de um magistrado. Kassio também contestou o uso de mensagens privadas obtidas por hackers e atribuídas ao ex-juiz federal da Lava Jato e a integrantes da força-tarefa em Curitiba para reforçar as acusações contra Moro. Para o ministro, o teor das mensagens não pode ser usado para reforçar a suspeição de Moro. Esses dois pontos foram rechaçados por Gilmar Mendes após a leitura do voto do colega.
“Se o hackeamento fosse tolerado como meio para obtenção de provas, ainda para defender-se, ninguém mais estaria seguro de sua intimidade, de seus bens e de sua liberdade, tudo seria permitido. São arquivos obtidos por hackers, mediante a violação dos sigilos ilícitos de dezenas de pessoas. Tenho que são absolutamente inaceitáveis tais provas. Entender-se de forma diversas, que resultados de tais crimes seriam utilizáveis, seria uma forma transversa de legalizar a atividade hacker no Brasil”, afirmou Kassio.