27/05/23
Por João Gabriel/Julia Chaib/Matheus Teixeira/Renato Machado//Folhapress
blogfolhadosertao.com.br
Em reunião nesta sexta-feira (26), o presidente Lula (PT) disse às ministras Marina Silva (Meio Ambiente) e Sonia Guajajara (Povos Indígenas) que precisará buscar alternativas para reverter o desmonte ambiental, admitindo que está sem força no Congresso.
Segundo interlocutores disseram à reportagem, Lula assegurou que, independentemente do setor onde instrumentos como o CAR (Cadastro Ambiental Rural) e a demarcação de terras indígenas estejam, sua gestão cumprirá o compromisso de preservar o meio ambiente e a defesa dos povos.
A reunião aconteceu após o Congresso desidratar as pastas de Sonia e Marina na discussão da medida provisória que estrutura a Esplanada dos Ministérios.
Na última quarta-feira (24), a comissão mista para analisar o tema aprovou o relatório do deputado Isnaldo Bulhões (MDB-AL) no qual ele retira do Meio Ambiente o CAR, a ANA (Agência Nacional de Águas), além de uma série de sistemas.
O primeiro instrumento vai para a Gestão (da ministra Esther Dweck) e o segundo para o Desenvolvimento Regional (de Waldez Goés); o Sinisa (Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico), o Sinir (Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos) e o Singreh (Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos) vão para o Ministério das Cidades (de Jader Filho).
Já o reconhecimento e a demarcação de terras indígenas, hoje no Ministério dos Povos Indígenas, vão para a Justiça.
Na mesma quarta, a Câmara também aplicou mais duas derrotas à política ambiental do governo, avançando o projeto de lei do Marco Temporal para demarcação de terras e uma medida provisória do governo de Jair Bolsonaro (PL) que, em razão de uma emenda, afrouxa a proteção à mata atlântica.
O movimento do Congresso desagradou o setor ambiental do governo e fez Lula convocar uma reunião com Marina Silva e Sonia Guajajara, além de seu conselho político —Alexandre Padilha (Relações Institucionais), Rui Costa (Casa Civil), Paulo Pimenta (Comunicação), o líder do governo no Congresso Randolfe Rodrigues e o líder do governo na Câmara José Guimarães (PT).
Após o encontro, Rui afirmou que o texto da MP (medida provisória) da reestruturação da Esplanada dos Ministérios está “desalinhado” com a visão do governo, que trabalhará para reverter as mudanças durante a votação no plenário da Câmara dos Deputados e no Senado.
Durante o encontro, Lula discutiu com os ministros a possibilidade de realizar, por exemplo, uma gestão compartilhada tanto da demarcação de terras indígenas quanto do CAR.
O diagnóstico é que, sem forças no Congresso, é difícil que qualquer dessas alterações consiga ser desfeita no plenário da Câmara e do Senado e que, por isso, é necessário buscar alternativas que dependam apenas de normas internas ao Executivo, como portarias.
O resultado do encontro é que, agora, o governo além de ainda tentar articular no Congresso, já vai estudar qual a melhor forma de construir essa estrutura sem depender de parlamentares.
Segundo interlocutores dos setores do governo presentes na reunião, uma das possibilidades, por exemplo, é que tanto as decisões do CAR quanto sobre demarcação de terras sejam referendadas por Meio Ambiente e Povos Indígenas, respectivamente.
Outra é a criação de conselhos, chefiados pela Casa Civil, mas com presença de membros dessas pastas, para atuar no processo de cada um destes instrumentos retirados de suas áreas originais.
Em resumo, o entendimento é que o relatório aprovado pela comissão do Congresso abre brecha para que a parte técnica e a fundamentação das decisões sobre as políticas ambientais sigam a cargo do Meio Ambiente ou dos Povos Indígenas.
Portanto, faz mais sentido diante do cenário atual aprovar a medida como ela está do que tentar bancar uma disputa que pode custar ainda mais ao governo —por exemplo, os parlamentares deixarem a medida provisória caducar, o que faria o Executivo ter todo seu desenho da Esplanada desfeito.
Segundo presentes, o tom da reunião ditado por Lula foi o de que o governo vai assegurar a efetivação das políticas ambientais.
No encontro, não se chegou a uma conclusão sobre qual a melhor solução. As alternativas de veto ou de judicialização foram descartadas.
Um veto no caso da demarcação, por exemplo, seria ineficaz no entendimento dos presentes, uma vez que faria a estrutura do governo retornar ao que era na gestão Bolsonaro (ou seja, quando a delimitação dos territórios já era competência da Justiça).
No entendimento de membros do ministério de Sonia, o fato de Flavio Dino ser o atual ministro da Justiça dá segurança de que os processos seguirão tendo a celeridade que necessitam.
Após o encontro, Padilha afirmou que trabalhará para reverter a situação, mas disse que a eventual manutenção da decisão do Congresso de esvaziar as pastas ambientais não evitará o governo de implementar o projeto do presidente Lula de, segundo ele, proteger a natureza.
Rui, por sua vez, relativizou a derrota sofrida no Legislativo: “A maior parte dos pontos preservou aquilo que era conceito original da MP, mas alguns pontos não foram mantidos. Portanto o governo trabalhará em outros espaços legislativos para que pontos que foram mexidos e, em nossa opinião, estão desalinhados com as políticas que precisam ser implementadas, possam retomar o conceito original”.
A negociação que prejudicou as duas ministras contou com aval do Palácio do Planalto.
O chefe do Executivo priorizou manter as atribuições da Casa Civil, por exemplo, na articulação com o Congresso, em vez de ter se esforçado em favor das pautas ambientais.
O principal temor do governo no embate entre Marina e o Congresso é que, caso haja esforço efetivo do governo para que o Senado altere pontos, a Câmara decida retaliar o Planalto e deixe a MP da reorganização da Esplanada dos Ministérios perder validade. Na prática, isso implicaria na volta da estrutura administrativa de Bolsonaro.
A proposta ainda precisa passar pelos plenários da Câmara e do Senado e ter sua tramitação concluída até 1º de junho.
Desde o início, o governo já previa que as concessões previstas no relatório seriam inevitáveis devido à atual correlação de forças no Congresso. A ala política tinha o diagnóstico de que seria muito difícil enfrentar a articulação da bancada ruralista na área agrária e ambiental.
Rui, entretanto, afirmou que a votação foi apenas na comissão e prometeu trabalhar para reverter a situação. “Agora, nas outras instâncias, vamos focar nesses pontos para reabilitar o conceito original da medida provisória”.
“A definição e os critérios que garantem o equilíbrio ambiental e o regramento que a lei e a Constituição estabelecem sobre as prioridades de uso da água, esses, no nosso entender têm que ficar no Ministério do Meio Ambiente e nós trabalharemos nas outras instâncias”, afirmou.