O plano foi lançado durante o painel de discussão O Desafio do Lixo nas Águas – do Continente ao Mar, no auditório do Centro Cultural Cais do Sertão. Fotos Rocha/Semas
Estimativas apontam que até 2050 haverá mais plástico do que peixe nos oceanos. Pesquisas revelam que 25 milhões de toneladas de lixo vão para o mar todo ano e que 80% deste montante vêm do continente. É preciso fazer algo urgente para transformar esta realidade. Na tarde desta sexta-feira (18/03), no auditório do Centro Cultural Cais do Sertão, aconteceu o painel de discussão “O Desafio do Lixo nas Águas – do Continente ao Mar”, onde a Secretaria de Meio Ambiente de Pernambuco lançou oficialmente o Plano de Ações de Combate ao Lixo no Mar (Pacolmar-PE), uma iniciativa que contou também com a contribuição da Agência Estadual de Meio Ambiente, Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação de Pernambuco e da GIZ e Ministério do Meio Ambiente. Trata-se de um importante instrumento de gestão elaborado, de forma participativa, para propor medidas de prevenção e combate ao lixo no mar no estado de Pernambuco, com foco especial na gestão de resíduos sólidos.
No painel de discussão, estavam presentes o secretário estadual de Meio Ambiente, José Bertotti; o engenheiro Bertrand Sampaio; Everton Oliveira, fundador do Instituto Água Sustentável; Maurício Guerra, superintendente estadual de Conservação e Biodiversidade; e Carlos Silva, presidente da Abrelpe – Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais engenheiro. Bertrand Sampaio participou da elaboração do plano quando atuava na Semas e contou que a ideia surgiu em meio ao maior crime ecológico que ocorreu em 2019, quando as praias do litoral nordestino foram invadidas pelo petróleo.
“É uma satisfação grande de ter, primeiro passado esse período com os colegas da Semas e foi uma experiência muito gratificante, mas sobretudo de ter participado da elaboração deste plano. É muito interessante porque não sou um homem do mar, sou um homem da terra, até descobrir que 80% do lixo sai do continente e vai para o mar. Isso começou a me deixar bastante preocupado, tem alguma coisa errada com a questão dos resíduos que estão chegando no mar, naturalmente que tem alguma coisa com a gestão dos resíduos no continente. E aí nós estávamos exatamente passando por problemas graves sobretudo relacionados com a questão daquele crime ecológico que foi o derramamento de petróleo no nosso litoral e de todo o Nordeste, e numa oportunidade eu tive o prazer de conhecer o Terra Mar, do projeto GIZ, e aí conversando, eu disse que a gente precisava de um plano, um plano de gestão de redução de lixo no mar, de combate”.
Bertrand contou que, mesmo com toda a dificuldade da pandemia, o plano conseguiu se materializar. “A partir de um levantamento, a gente traçou uma série de estratégias dentro do que possível fazer naquele momento em função da imensa dificuldade que era trabalhar em campo no meio de uma pandemia, mas a gente conseguiu. Foram percorridos os 15 municípios litorâneos, 187 km de costa, e esse levantamento, esse panorama, permitiu identificar isso que já era a nossa primeira angústia: que 80% do lixo sai do continente. Tem um problema muito grave na gestão dos resíduos sólidos, tem um problema grave certamente de educação ambiental, de operação, então isso foi sendo trabalhado… e nesse panorama, nessa primeira etapa do levantamento, constatou-se exatamente isso, a partir do levantamento com relação tanto aos serviços que eram prestados nesses 15 municípios com algumas falhas que precisam ser tratadas e também com relação a uma série de outros fatores que contribuem para isso, desde eventos que são realizados na beira-mar, de festa e o lixo que vem do mar para o mar (que representa pouco mais de 20%), que é o lixo que vem das embarcações, de redes de pesca. Aí nesse trabalho a gente começa a entrar um pouco nesse universo e identificar que de fato é uma questão gravíssima. São cerca de 400 toneladas de plástico que o mundo produz. Isso não é um problema de um governo, dois governos, é um problema da sociedade, de todos. Precisamos ter um trabalho forte em duas linhas: serviço público de limpeza urbana que precisa ser melhorado e a logística reversa para que as empresas comecem a cumprir cada vez mais esse compromisso, sem esquecer que o trabalho que os catadores vêm prestando é fundamental. O plano tem prazo, diretrizes, ações responsáveis e a gente precisa que a sociedade atue em conjunto para que esse plano aconteça e a gente comece a ver o reflexo disso nas nossas praias”, explica Bertrand.
“Lixo não anda sozinho, ele não vai para o mar sozinho, ele precisa ser levado de alguma forma, em geral o veículo é a água. E vocês têm que ter essa ideia completamente fechada na cabeça, pensar em como nós vamos manejar o resíduo. Quando nós pensamos no resíduo sólido, a gente pensa no aterro, o aterro é uma construção de engenharia que tem uma base impermeabilizada. Por que a base é impermeabilizada e por que é importante que nós coloquemos os resíduos no local que tenha esse tipo de construção? Porque nós não queremos que a contaminação chegue na água, porque a água é quem leva a contaminação para fora do local. Ou seja, nós estamos falando não só da garrafa pet, que é um lixo visível que nos agride visualmente, nós estamos falando de lixo dissolvido, que é levado pela água. Extremamente importante, porque muitas vezes a gente toma água sem saber que ela pode ter algum contaminante e nos fazer mal. É um ciclo completo que nós temos que entender. Nós estamos mandando água dos continentes para o mar há muitos anos, há muitos séculos”, lembra Everton Oliveira, do Instituto Água Sustentável.
O secretário José Bertotti ressaltou a importância de medidas práticas. “Um dia fui questionado sobre quando o Plástico Zero de Noronha chegaria aqui no continente. Em Noronha, essa é uma política vitoriosa, está dando certo, a gente conseguiu eliminar o uso de materiais descartáveis e nós temos uma belíssima experiência que pode ser trazida para o continente. E a ideia é exatamente essa. Noronha é um patrimônio natural da humanidade, portanto Pernambuco tem uma grande responsabilidade sobre Fernando de Noronha, mas ela também é um grande laboratório e porque é uma área extremamente sensível, a gente começa muitas políticas por lá. E deu certo. Tem um projeto de lei na assembleia legislativa que é a questão do não uso dos descartáveis, tem um projeto para começar a não se usar descartáveis nas praias que está sendo discutido e aí a gente poder então avançar nessa questão. A gente precisa mudar hábitos, e o custo do descartável que é aparentemente menor, na realidade ele se torna mais caro. A gente precisa ver que os sinais estão muito explícitos. O nosso plano de ação prevê um conjunto de possibilidades de ações que nós vamos ter que evidentemente trabalhar com as prefeituras, com as entidades da sociedade civil, especificar os nossos contratos de recolhimento de lixo e destinação adequada, como fazer o trabalho de coleta desse material e fazer com que a com a nossa população tenha consciência do custo que é não destinar e não descartar adequadamente o que já não tem mais uso pra gente mas que pode ter uso para outro no futuro”, ressaltou Bertotti.