27/06/20
O Globo/blogfolhadosertao.com
O novo ministro da Educação, Carlos Alberto Decotelli, vai encontrar em seu gabinete um texto pronto de decreto presidencial elaborado pela equipe de Abraham Weintraub. A proposta obriga as universidades federais de todo o país a prestarem contas sobre as políticas de cotas raciais e sociais em funcionamento. A medida prevê ainda a extinção do Comitê de Avaliação do sistema de cotas, instituído em 2012, mas só criado no final de 2018. A proposta de decreto segue a mesma linha da portaria que Weintraub assinou na véspera de pedir demissão e viajar para os Estados Unidos. A portaria se referia à política de cotas na pós-graduação e acabou sendo revogada após a demissão do ministro. Já o decreto trata da graduação no ensino superior.
A minuta determina que as federais deverão repassar informações sobre as cotas de seis em seis meses. O texto começou a ser preparado pela equipe de Weintraub em dezembro do ano passado. Antes de ser encaminhada ao Palácio do Planalto para assinatura do presidente Jair Bolsonaro seria preciso o aval do Ministério da Justiça e do Ministério dos Direitos Humanos. Estão vinculados a esses ministérios, respectivamente, a Funai e a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial, órgãos interessados em acompanhar as cotas para estudantes de negros e índios nas federais.
A equipe do ex-ministro queria obrigar as universidades a repassarem dados sobre os estudantes cotistas tanto ao MEC como à secretaria que cuida de promoções raciais, e atualmente está vinculada ao ministério de Damares Alves. A minuta de decreto, na primeira versão, propunha ainda explicitamente a extinção do Comitê de Acompanhamento e Avaliação das Reservas de Vagas, criado ainda não gestão da presidente Dilma Rousseff. Caberia a esse comitê avaliar o funcionamento da política de cotas. Os integrantes do comitê só foram indicados em 2018, no final da gestão do presidente Michel Temer. Leia mais: Abraham Weintraub cria crise até depois de sair do governo
Por sugestão da área jurídica do MEC, a referência à extinção do Comitê foi suprimida, mas continuou valendo na prática. Isso porque o texto revoga trechos do decreto editado na gestão Dilma que faziam referência à criação Comitê. Ou seja, sem eles o grupo de avaliação seria automaticamente extinto, como orientou a consultoria jurídica do ministério. A lei de 2012 que instituiu o sistema de cotas sociais nas federais determinou que o modelo seria reavaliado após dez anos de vigência. Caberia ao Comitê a função de conduzir a avaliação da política de cotas. Segundo a proposta da equipe de Weintraub, novo decreto transfere a competência dessa avaliação do comitê para os ministérios envolvidos, incluindo a Funai, no caso dos dados sobre vagas destinadas à índios.
No dia 23 de setembro do ano passado, a equipe de Weintraub se reuniu com subordinados de Damares para “alinhamento” em relação à avaliação e monitoramento das políticas de cotas nas federais. No encontro, representante da Secretaria de Ensino Superior do MEC alegou que o ministério só detinha os registros sobre cotas registras no sistema Sisu, que serve para acesso às universidades a partir das notas obtidas pelos candidatos no Enem.
Representante da Secretaria de Políticas de Promoção da Igual Racial, vinculada à Damares, informou que também não tinha dados sobre o tema. Na gestão de Temer, havia sido enviado pedido às universidades sobre os dados da política de cotas. Menos da metade das federais teria respondido segundo o relato feito na reunião. Os subordinados de Damares chegaram a comentar que estavam em contato com a Escola Nacional de Administração Pública (Enap) para montar um modelo de avaliação das cotas, incluindo realização de pesquisa com alunos.
O texto do decreto passou por pequenos ajustes até chegar formalmente ao gabinete de Weintraub. O ministro pediu demissão antes de assiná-lo.
Procurado, os ministério da Educação e da Justiça não se manifestaram. O Ministério de Direitos Humanos informou que não tem conhecimento do texto do decreto. Integrantes da Pasta de Damares admitiram que fizeram reuniões com o MEC para tratar da política de cotas raciais no final do ano passado.